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O Planeta do Carnaval

Durante o Carnaval de 2012, em Salvador da Bahia, um casal decidiu fazer algo bem diferente: No meio do trio elétrico, em plena avenida, eles realizaram um casamento simbólico, trocando votos e juras de amor eterno no meio da multidão festiva. A cerimónia improvisada, regada a música e a muita alegria, tornou-se um dos momentos mais inesquecíveis daquela festa.

Penso que poderemos aceitar que o Carnaval – essa extravagância festiva – é um evento que nos transforma ao ponto de fazer o coração acelerar ao mesmo tempo que os pés se movimentam num ritmo frenético. O evento é muito mais do que uma simples celebração; é uma explosão de cores, ritmos e tradições que ecoa por todos os cantos do globo.

O Carnaval, que hoje conhecemos como uma festa desenfreada de dança e alegria, tem raízes profundas na antiguidade. Os historiadores sugerem que o evento pode ter tido várias origens. Por exemplo, na Mesopotâmia, encontramos as Saceias, onde alguns prisioneiros se metamorfoseavam temporariamente em reis, vivendo uma vida luxuosa por alguns dias, seguidos por um desfecho muito pouco agradável. Uma tradição que, de certa forma, ecoa nas nossas sátiras políticas e inversões de papéis tão presentes nos nossos dias.

Também o antigo Egito pode ter adicionado um pouco do seu glamour, ao juntar as festividades a Isis [deusa da fertilidade, maternidade e da magia que representava o ideal de mulher, esposa e mãe dedicadas] que envolviam pinturas faciais, danças e bebidas, dando a sua pitada de alegria aos rituais religiosos e agrícolas.

Já os romanos, com as suas tão famosas Lupercálias [celebração cujo objetivo era o de afastar maus espíritos e realizar uma purificação para garantir a fertilidade], alguns dos escravos se tornavam senhores e vice-versa, enquanto se entregavam a danças e a banquetes repletos de excessos.

Com o advento do Cristianismo, as festividades carnavalescas encontraram alguma resistência. A parte conservadora do poder da Igreja Católica tentou domar essas celebrações, inserindo-as nos dias que antecedem a Quaresma, uma tentativa de enquadrar a alegria nos limites do conservadorismo religioso.

Na Idade Média, a irreverência atingiu o seu auge, com homens solteiros vestindo-se de mulheres, invadindo casas e desfrutando de banquetes e beijos, “ingredientes” aceites por estarem envolvidos em pitadas de muito humor.

O Renascimento acrescentou canções, desfiles e carros decorados em Florença, enquanto em Roma e Veneza, a misteriosa bauta [geralmente, um chapéu de três pontas e um manto preto] tornava-se a marca registada dos foliões.

Ao desembarcar no Brasil, o Carnaval ganhou uma riqueza multifacetada, fundindo as tradições portuguesas, indígenas e africanas e inovando para algo inusitado e de proporções inimagináveis. Paneladas, queima do Entrudo, tambores dos “Zé Pereiras“, e o lançamento de farinha, ovos e água tornaram-se elementos essenciais dessa festa contagiante.

Assim, essa “Terra de Vera Cruz” se transformou na capital mundial do Carnaval, onde os ritmos do Samba, Axé, Afoxés, Frevos, Maracatus e Marchinhas se entrelaçam com muito suor e calor humano, proporcionando uma celebração de alegria coletiva única no mundo.

Ao longo dos séculos, o Carnaval evoluiu, adquirindo novas tradições e elementos distintivos em diferentes regiões. Veneza, com suas máscaras elaboradas, transformou-se no epicentro da sofisticação carnavalesca. Na América Latina, o samba brasileiro invadiu as ruas com sua batida contagiante, tornando o Carnaval do Rio de Janeiro um espetáculo de proporções épicas.

Na década de 1900, Nova Orleans importou a tradição do Mardi Gras, com desfiles extravagantes e colares de contas lançados aos foliões. A cultura afro-caribenha influenciou o Carnaval de Trinidad e Tobago, tornando-o uma experiência única com suas competições de calipso e soca.

Cada região imprime as suas características únicas ao Carnaval, refletindo as suas tradições, história e cultura.

Além dos já muito conhecidos carnavais, o Carnaval de Veneza se destaca pelas elegantes máscaras e trajes de época, transportando os participantes para um tempo de esplendor renascentista. Enquanto isso, o Carnaval de Notting Hill, em Londres, é uma explosão de cores vibrantes, com influências caribenhas e africanas. Na Ásia, Goa, na Índia, oferece uma versão exuberante do Carnaval, com desfiles e festivais de rua que misturam tradições portuguesas, goesas e fervor festivo global.

Num episódio que misturou folia e gastronomia, um carro alegórico representando uma fábrica de salsichas perdeu o controle, libertando salsichas gigantes que rolaram pelas ruas. Os Foliões, ao invés de fugirem do perigo, deram início a uma batalha de salsichas, transformando a avenida numa batalha campal de embutidos.

Em cada canto do planeta, o Carnaval revela-se como um fenômeno cultural único, refletindo a riqueza da diversidade humana.

Das antigas festas pagãs aos desfiles grandiosos, o Carnaval é uma celebração que transcende fronteiras, convidando-nos a participar dessa dança global de alegria, música e cores.
Então, solte a criatividade, ponha sua melhor fantasia e junte-se à festa – porque no Carnaval, o mundo é o nosso palco e a diversão é a estrela principal!

Divagações de António Cunha

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